Sunday, August 07, 2005

O primeiro dia

O primeiro dia do resto da minha vida já foi há tanto tempo que lhe perdi de vista os contornos. Já não estou bem no silêncio, no borburinho da solidão. Sou diferente, estou diferente, sinto-me diferente. Sinto-vos diferentes. O meu corpo, de facto, fraqueja, mais ainda a minha alma. A diferença está em mim. Preciso de beber coragem de copos vazios, à semelhança de palavras que oiço na minha cabeça.

Tuesday, October 26, 2004

Reunião

"Reunião?" repetiu ela incrédula. "Porquê agora? Porquê logo neste momento de paz?"
Atrapalhou-se naquela pressa juvenil, de poucas dores ainda no corpo. Ainda que eu soubesse que eram muitas, demasiadas para as que ela deveria suportar.
Se ao menos a pudesse ajudar, se ao menos ela ouvisse algo dentro dela, se lhe pudesse segredar, baixinho, aquelas palavras preciosas que fariam toda a diferença. Fariam mesmo? Será? Não me esqueço nunca que todos os fins são iguais. E queria tanto que este fim fosse diferente. Queria tanto que ela ouvisse aquelas palavras que andam perdidas dentro dela, que lhe iam revelar todas as respostas. Mas não, sento-me aqui e vejo-a sofrer. Uma filha perdida. Uma rebeldia minha, e seria diferente. Mas sinto-me sem forças. E não quero confundi-la mais. Atrás de umas respostas vêem sempre mais perguntas. Nunca podemos tirar apenas aquele pedacinho de ar dos nossos pulmoes. Temos que expirar longamente.

Tenho que expirar longamente.

Monday, September 20, 2004

"Deixa-me " disseste tu ?
Sim ouviste bem. Deixa-me. Desculpa se não fazia parte dos teus planos. Se não era o que tu esperavas. Se não me encaixo nessa tua ignomínia de semelhanças hierárquicas e temporais.
Não gosto do vosso mundo. Deste mundo de discurso intrincados em reviravoltas pseudo democráticas. Perdoem-me se vos quero matar, se vos quero ver mortos e enterrados nessas vossas palavras de cinismo abrupto. Que vos fiquem a impedir a circulação sanguínea, para que possam explodir corações. Se é que os têm.
Desculpem se nao me encaixo nos vossos perfis de pessoa, de social, de esquemas múltiplos e vazios. Estou farta dos vossos testes, estou farta da vossa arrogância, estou farta do sistema. Ao diabo com esse "sistema". Ao diabo com quem o apoia e o faz girar. Morram. Deixem-nos o mundo para o fazermos.

A minha réstia de rebeldia de juventude? Não. Não, decerto.
Mexam-se. Gritem. Façam algo. Agora, sem mais demora.

Wednesday, September 08, 2004

Hoje.

Saiste daqui hoje, cabisbaixa e ciente da tua fraqueza. Não conseguiste descobrir a tua força, no meio dessa confusão que girou em torno de pequenos nadas. Viste a tua vida a mudar. Viste o presente tornar-se passado e a dor tomou conta de ti. Temo que não consigas erguer-te, mas tenho fé. Aquela fé que sempre me perseguiu desde que te vi nascer. Foram derramadas tantas lágrimas para vires a este mundo, que cheguei a pensar que que afogarias prematuramente. E agora temo as lágrimas secas que ficaram por derramar.

Wednesday, July 28, 2004

Desafio

Vens do fututro, dizes tu?
Sorrio.
Vens de lá, dos confins da vossa imaginação. Rebeldes, que vocês se tornaram.
Sorrio outra vez.  Arrogante, pensarás. Talvez.
Diz-me o que vês, guerreiro, nesse futuro tão próximo e tão fechado. Nessa tua incoerência fatalista. Que fazes tu com a teoria do caos? Arremessa-a para um canto qualquer. Mas esconde-a bem, não vás tropeçar nela brevemente.
Vens do fututro, dizes tu. Nem o passado conheces. Não sabes os fogos da história. Não sabes o princípio do fim. Nem o fim do príncipio. Queres saber como acaba e nunca como começa. Pega na ponta certa se queres descobrir este véu.
Como começa, perguntas tu...? com mais mortes, mais vidas do que aquelas que ja viste. Começa antes do que possas imaginar. Começa fora do teu contexto. Não terás culpa, certamente.
Tu vens do futuro. Eu  sou o passado.  Os olhos que sentes a perseguirem-te são a nossa presença. Porque estamos aqui muito antes do fim. Ou do começo. Cansados de termos razão. Cansados de vermos os vossos mártires, iguais aos nossos.  Iguais a todos os mártires. A todos os loucos e visionários.  Cansa-nos o desgosto de vermos mundos iguais, sofrimentos iguais em corpos diferentes.
Tantas lições que tens que aprender. Nós estamos sempre à espera. Uma quaquer profecia que todos conhecemos : o fim será sempre igual. Desafio-te a fazeres-me crer o contrário.
És capaz..?